No próximo dia 24 de outubro, domingo, o projeto Bate Papo com Sabor realiza mais uma edição no Krug Bier. Só que dessa vez será diferente: será no horário do almoço. E apenas um prato fará parte do cardápio: a Paella. O prato será elaborado pelo Chef Carlos Pita e pelo Chef Siri. Normalmente são 4 itens no cardápio, incluindo 2 entradas e uma sobremesa além do prato principal. E as edições anteriores foram sempre a noite.
Esse projeto faz parte das mudanças que o Krug Bier está promovendo no seu cardápio, valorizando mais o almoço, com pratos executivos e individuais. A casa sempre privilegiou petiscos e iguarias mais adequadas para acompanhar as cervejas e chopes da casa. Em breve serão anunciadas novidades.
O Bate Papo com Sabor é um projeto que visa integrar uma boa prosa, pessoas interessantes e gastronomia. Começou em novembro de 2006, já passou por mais de 14 lugares diferentes em Belo Horizonte e está na sua 56ª edição. Quem for prestigiar, compra o passaporte e pode degustar todos os pratos oferecidos a vontade. As bebidas não estão inclusas.
Serviço:
Krug Bier
Bate Papo com Sabor – domingo, dia 24 de outubro de 2010
Das 13h as 16h
R$ 32,00 por pessoa (bebidas a parte)
Rua Major Lopes, 172
Bairro São Pedro
Belo Horizonte – MG
Tel: 3286-0061 e 2535-1122
Aceita todos os cartões de crédito;
Capacidade: 330 lugares
Serviço de estacionamento com manobrista;
Horário de funcionamento:
• 2ª à 6ª – de 17h30 até o último cliente;
• Sábados e domingos – de 12h até o último cliente;
www.krug.com.br/chopperiakrug-bier
HISTÓRIA DA PAELLA
Como o fazem os brasileiros ao reunirem familiares e amigos no fim de semana para saborear uma feijoada ou uma churrascada à beira da grelha, os espanhóis elegeram há séculos, em seu ritual comunitário dominical junto ao fogão, a preparação da paella. A receita dessa iguaria, que é de longe a especialidade ibérica internacionalmente mais conhecida, nasceu na região de Valência, junto ao Mediterrâneo.
O prato surgiu como alimento rural, nos séculos XV e XVI. Os camponeses saíam de manhã para o trabalho, levando um pouco de arroz, óleo de oliva e sal, além da paella - uma panela rasa e de grande diâmetro, que lembra a frigideira e teria origem na antiga patella dos romanos (leia quadro nesta reportagem). No campo, agregavam e enriqueciam a receita com os ingredientes que porventura encontravam: carnes de caça e legumes da estação. Embora tais ingredientes costumem brilhar e roubar a cena nos dias de hoje, é o arroz o verdadeiro protagonista e o componente indispensável deste prato emblemático da culinária espanhola mais tradicional.
O arroz é uma herança gastronômica deixada pelo longo período de dominação árabe na região. Hoje, mais que um mero hábito de consumo, pode-se mesmo definir como sendo devoção que o espanhol dedica ao cereal, considerando as incontáveis maneiras de prepará-lo por lá. Registros históricos dão conta que o grão desembarcou na Península Ibérica por volta do século VI, pelas mãos dos bizantinos. Seu cultivo e consumo mais intensivos e sua conseqüente popularização, porém, só se consolidou dois séculos depois, com os árabes. A primeira grande plantação de arroz, na Espanha, surgiu nas proximidades da cidade de Valência, numa lagoa de água doce chamada La Albufera - "Pequeno mar", em árabe -, que tem vários pontos de contato com o Mediterrâneo, e é cercada por terras baixas e pantanosas, ideais para o seu cultivo. Mais tarde, se espalhou rumo a outras áreas costeiras e o interior, especialmente o delta do rio Ebro e a cidade de Múrcia.
Paella valenciana: na terra natal do prato, tradição diz que ela deve ser feita só em fogão de lenha
Versatilidade camaleônica
Curiosamente, os espanhóis, nos seus primeiros contatos com o arroz, o preferiam na sobremesa. Datado de 1325, o Arroz com Leite, temperado com açúcar e canela (variação do nosso Arroz Doce, que, por sua vez, é uma herança dos colonizadores portugueses) é uma das receitas ibéricas mais antigas de que se tem registro. Com o tempo, a cozinha ibérica foi se aprimorando no preparo de uma infinidade de receitas salgadas que têm o arroz como base. Além de mais barato que outros cereais, o arroz, entre outras vantagens culinárias, absorve o sabor e os aromas dos ingredientes que o escoltam numa receita. Na paella, ao ser cozido, cada grão funciona como uma pequena esponja em contato com as diferentes carnes, peixes, vegetais e frutos do mar. Quando há talento e sensibilidade nas mãos de quem cozinha, o resultado, claro, é ainda melhor.
Na Espanha, a paella é preparada tradicionalmente pelo homem - e só excepcionalmente pela mulher. A origem dessa tradição remonta à Espanha medieval, época em que os chefes de família retornavam de suas empreitadas no final de um dia, ou por vezes semanas, com o fruto da caça e da pesca. Às carnes abatidas e fisgadas - lebre, pato e, depois, a então rara e nobre galinha - se incorporava o arroz, o azeite e o sal.
Cozinhavam tudo ao ar livre no fogão de lenha e, portanto, longe da cozinha, território tradicionalmente feminino. O resultado? Uma alquimia opulenta, aromática (nos primórdios, utilizava-se a madeira de laranjais, daí seu perfume incomparável), feita especialmente "por ellos pa'ellas". Mas cuidado: a pronúncia correta é algo próximo de "pa-ê-ia", jamais "paeja", como argentinos e uruguaios costumam pronunciá-la, para horror dos espanhóis de origem.
Como reza a tradição
Em Valência, em especial, a terra natal da paella, o ritual de preparação é ainda mais rigoroso. Despreza-se o fogão a gás. A paella valenciana tradicional é feita sempre em fogão de lenha. Nesse aspecto, em especial, lembra o nosso churrasco - também uma elaboração comunitária de fim de semana com contornos festivos. Em ambos os casos, o fogo aceso ao ar livre tem um atavismo subliminarmente masculino. Seu preparo, de feitura trabalhosa, constitui, portanto, um privilégio dos homens que, em ocasiões ou datas especiais, desejam testar seus dotes culinários e, assim, impressionar suas mujeres.
Muitos estudiosos da culinária ibérica acreditam que o alto grau de dificuldade em fazer a paella ajuda muito a explicar a razão de o homem espanhol, conhecido por ser tão cioso de sua virilidade, sentir-se atraído pelo desafio em elaborá-la. Seja como for, depois de ganhar fama em Valência, a paella alcançou o litoral, onde passou a ser feita com frutos do mar. Ali, recebeu o nome de paella marinera. O processo de migração e aculturação do prato também deu origem à paella negra (que incorporou a lula e a sua tinta escura característica - daí seu nome de batismo). Desse modo, a receita foi ganhando outras regiões do país e inúmeras versões. Hoje, elas somam mais de 1.000 em toda a Espanha, relatam algumas enciclopédias gastronômicas.
Em São Paulo, o prato chegou na primeira metade do século XX, pelas mãos dos imigrantes. Coube a alguns restaurantes da cidade, caso dos conhecidos Don Curro e Los Molinos, o papel crucial de difundi-lo, celebrizando seu ritual e sua fórmula original. Por tratar-se de um prato de execução complexa, a começar pelo ponto extremamente delicado de cada ingrediente até a irresistível plasticidade de sua apresentação, seu preparo exige uma série de procedimentos, incluindo alguns macetes na hora de elaborá-lo.
O arroz, por exemplo, ao contrário do risoto italiano, deve ficar seco e solto. Para isso, ele nunca deve ser lavado e sequer mexido durante o cozimento, para formar na panela o socarrat, aquele delicioso queimadinho que gruda no fundo da panela. As carnes, por sua vez, também devem ser bem refogadas, para que formem o tal fundo. Já a água precisa cozinhar no mínimo por 25 minutos, a fim de incorporar o sabor dos ingredientes.
A tradição manda, ainda, que seus felizardos apreciadores sentem-se em volta da paellera e sirvam-se diretamente dela (esse modo comunitário de comer provém muito provavelmente dos árabes). A paella, portanto, é dividida em tantas partes quantas forem as pessoas presentes à mesa. E cada uma delas vai se servindo apenas do delicioso território que lhe coube, ou pôde escolher.
Origem divina
Até onde se sabe, o nome da paellera (utensílio que lembra a frigideira) vem de patella, usada na Roma antiga para as oferendas aos deuses nos rituais de fecundação da terra. Outros sustentam que a palavra latina ainda tem relação com a deusa Patelena, invocada para proteger plantações. Enfim, há grande semelhança entre a patella dos romanos e a paella dos espanhóis, no formato e nas dimensões, assim como se parecem os ingredientes básicos dos rituais: a lenha, o fogo, o comando masculino da cerimônia realizada ao ar livre. No século XVI, o utensílio já era chamado, em valenciano, de paella.